17 de julho de 2008

O que querem os movimentos camponeses?

Maria José da Costa, da Via Campesina, explica que as reivindicações dos movimentos camponeses têm como objetivo a produção de alimentos mais baratos e saudáveis; segundo ela, para implementá-las, governo gastaria bem menos recursos do que o que foi “doado” ao agronegócio na renegociação da dívida

18/06/2008

Eduardo Sales de Lima
da Redação
Infográfico das mobilizações pelo país
Leia a íntegra do documento
entregue ao governo Lula



Representantes de movimentos sociais do campo organizados pela Via Campesina entregaram, na quinta-feira (12), ao governo Lula um documento com as “Propostas Estruturantes a Curto Prazo” para o desenvolvimento social e econômico do campo brasileiro.

Intitulado “Plataforma da Via Campesina”, o documento exige mudanças do atual modelo agrícola. “O principal interessado nessa questão da crise de alimentos é o agricultor e a agricultora que produz, mas também todos aqueles que querem alimentos de qualidade e a um preço acessível”, afirma Maria José da Costa, da coordenação nacional da Via Campesina, em entrevista ao Brasil de Fato. Para ela, o caminho que solucione os entraves no campo passa pela restruturação das comunidades camponesas, com o respeito à biodiversidade.
Na mesma semana em que entregou o documento ao governo, a Via Campesina organizou manifestações em diversos estados em protesto contra o agronegócio e a atuação de empresas estrangeiras no país – fatores considerados fundamentais no levantamento das causas da recente alta dos preços dos alimentos.

Brasil de Fato - As manifestações da Jornada de Lutas conseguiram chamar a atenção da sociedade e denunciar as transnacionais do agronegócio?
Maria José da Costa - Há alguns fatos que comprovam que essas ações têm chamado, sim, a atenção da sociedade. Um é o próprio número de questionamentos nas mobilizações. O outro é a demanda pelos próprios meios de comunicação das informações em relação às ações. No Rio Grande do Sul, um número muito grande de pessoas ficaram feridas e também foram presas, com companheiros hospitalizados. A gente está conseguindo fazer com que o debate chegue na sociedade; o principal interessado nessa questão da crise de alimentos é o agricultor e a agricultora que produz, mas também aqueles que compram e que querem alimentos de qualidade e a um preço acessível.

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Precisamos pensar em grandes centros de distribuição,
de comercialização dos alimentos, porque os grandes conglomerados
de distribuição funcionam como atravessadores,
e não deixam o alimento chegar barato na mesa dos trabalhadores
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Agora, no que tange as Propostas Estruturantes de Curto Prazo, como funcionaria um programa que contemplasse a agroindústria familiar? É verdade que, nos últimos anos, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) vem agindo de modo mais efetivo na relação com a com produção camponesa?
Não podemos negar que essa foi uma das principais ações desse governo em relação a questão da agricultura camponesa. No entanto, podemos continuar produzindo bastante, mas se nós não tivermos uma linha direta com o consumidor, não somente através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que é gerido pela Conab, mas por meio de outros programas de aquisição que sejam iniciativas do governo, vamos continuar entregando a nossa produção para as grandes redes de distribuição baseadas na integração e no modelo petroquímico. A Conab precisa de mais estrutura, de mais técnicos e de um volume maior de recursos para que chegue a todos os cantos onde tenha agricultores e a agricultoras produzindo. Infelizmente ela (Conab) ainda cumpre somente um papel de regulador do mercado. Porém, a Conab precisa dar um passo a mais que é, de fato, de estocar alimento, que ela faz, mas faz pouco e também, distribuir alimento. Hoje, precisamos pensar em grandes centros de distribuição, de comercialização dos alimentos, porque os grandes conglomerados de distribuição funcionam como atravessadores e não deixam o alimento chegar barato na mesa dos trabalhadores. Isso é o que está faltando de fato em muitos setores, como a cadeia do leite, a do frango, dos suínos. Os agricultores terminam entregando sua produção para as transnacionais, e não para os consumidores.

Quanto ao modelo da agroenergia produzida a partir da agricultura camponesa, seria necessário, de fato, uma estatal que direcione, regule e fomente a produção, garantindo uma maior estabilidade para as famílias envolvidas nesse processo?
A estratégia de produção de alimento e energia passa por uma outra lógica, que não é essa, por exemplo, do petróleo. É preciso que de fato haja uma compreensão de como que funciona o campo, os sistemas camponeses. A produção de agroenergia por meio das grandes monoculturas não vai resolver em nada, inclusive porque o que eles chamam de energia limpa é produzida a base de petróleo, com a utilização de insumos petroquímicos. É preciso ter uma subsidiária, que pode ser da Petrobrás, que tenha esse foco da compreensão dos sistemas camponeses de produção.

Hoje, a produção de fertilizantes é monopolizada, enquanto que até meados dos anos 1990, a Petrobrás era responsável pela produção. Por que os movimentos defendem uma estatal de fertilizantes para baratear esses insumos?
Até 1994, a produção da maior parte dos fertilizantes era, de fato, da Petrobrás. Só que de 1994 para cá, houve a privatização desta atividade. Hoje, nós temos três grandes empresas que monopolizam o ramo de fertilizantes: é a Bunge, a Iara e a Mosaic. Nós temos bastante nitrogênio porque faz parte da cadeia do petróleo. Se considerar o fósforo e o potássio, nós temos pouquíssimo aqui, no Brasil, e temos que importar de outros países, o que encarece muito o produto e causa dependência. A saída seria termos uma empresa estatal ou reestatizar a produção dos fertilizantes, tanto os minerais como os orgânicos. Nós temos no Brasil essa possibilidade, que existe em poucos lugares. Nós temos ótimas possibilidades de construir a soberania alimentar e de utilizar os biodigestores, também com essa finalidade: produzir energia e utilizar resíduos da produção alimentar para a adubação. Com a matéria verde que temos em nosso país, é extremamente possível a gente demandar, de forma organizada, uma outra base de fertilizantes para a nossa agricultura.

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Defendemos que o povo pague, no
mínimo, a mesma tarifa de energia que
as empresas pagam
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Na carta também são defendidas três pautas ligadas à agricultura camponesa e a crise alimentar. A necessidade da implementação da tarifa social, o programa nacional de habitação camponesa e da universalização do abastecimento de água. Esses temas não estão diretamente ligados ao desenvolvimento da agricultura camponesa. Qual o grau de importância dessas pautas em relação ao fomento da produção?
No caso da tarifa social, as empresas, muitas delas transnacionais, consomem uma gama enorme da energia e nós, na verdade, é que terminamos pagando boa parte da energia. O que defendemos é que o povo pague, no mínimo, a mesma tarifa que as empresas pagam. Quanto à habitação rural, ter uma casa digna, uma morada digna, é uma necessidade para que até as pessoas não saiam do campo e vá para a cidade. E no caso da água, a sociedade brasileira ainda está um pouco apática em relação ao grande problema que vai se tornar.

Como a transposição do Rio São Francisco se insere nesse contexto?
O São Francisco se insere nisso perfeitamente. Já há muito tempo, o rio está sendo exportado através das frutas que vão para a Europa, para os Estados Unidos, para a Ásia. A água do São Francisco está sendo mandada para fora também através da grande expansão da produção de cana irrigada e da produção de camarão de água doce. Na verdade, ela vai sendo importada através de produtos das transnacionais. O fato é que na região do Semi-Árido existem reservatórios mais que suficientes de água. A própria Agência Nacional das Águas (ANA) é um órgão do governo que mostrou estudos efetivos, sérios, que nós utilizaríamos muito menos recursos para atender muito mais pessoas se adotássemos técnicas mais diversas e dominadas pela população. Para a Ana, esse seria um método mais eficiente de fazer realmente fazer a água chegar a quem, de fato, precisando dela.

Sobre o Programa de Reflorestamento, existe uma inclinação por parte do governo em aceitar as propostas feitas pela Via Campesina, ou até mesmo debater?
Na quinta-feira (12), protocolamos essa proposição no Palácio do Planalto, entregamos ao chefe-de-gabinete do presidente Lula, o doutor Gilberto Carvalho, que nos prometeu naquele mesmo momento passaria para as mãos do Lula. Ao protocolarmos o documento e ao termos as notícias da criação do Programa Mais Alimentos, achamos que é possível, sim, haver uma sinalização de debater esses temas porque a crise da alta do preço dos alimentos está latente. Mesmo porque só é possível resolvermos esse problema com a reestruturação das comunidades e das propriedades camponesas. Não serão gastos nem os mais de R$ 70 bi lhões que foram dados aos fazendeiros na renegociação da dívida.

Qual a expectativa dos movimentos camponeses para que essas políticas sejam, de fato, implementadas por parte da União?
Após as lutas que as organizações sociais vêm desenvolvendo, o próprio governo está formulando uma proposta para a habitação no campo, um espécie de programa nacional de habitação camponesa. Esse programa está sendo discutido com as organizações. É uma proposta que pode não resolver todos os problemas do déficit habitacional, mas é interessante, até porque está sendo construída também com a participação das organizações. No caso da assistência técnica, tivemos praticamente o dobro dos recursos, algo que também saiu da pauta das organizações. Está sendo criado agora o Programa Mais Alimentos e, na nossa pauta de 2003 até agora, apresentamos uma proposição de um Programa de Reestruturação das Comunidades Camponesas, que era um programa em que os recursos chegariam até R$ 100 mil e os juros eram de 2%, parecido com o que o governo está apresentando agora. De fato, o governo sentiu a pressão. O Bolsa-Família, embora precise dar um passo a mais, deu a possibilidade para milhões de famílias ter acesso a algo mais do que elas tinham, e um desses algo a mais é comida. Você pode botar R$ 100 bilhões no agronegócio e na agricultura patronal, mas eles nunca darão conta de produzir a comida para a nosso povo. São como sanguessugas, sobrevivem somente à base dos subsídios que o governo dá. Diferentemente da agricultura camponesa, que nem 50% acessa a crédito, mas produz mais de 70% do que o povo brasileiro consome.

Em audiência na Câmara, parlamentares e entidades afirmam que “democracia está ameaçada”

Durante audiência pública sobre a criminalização dos movimentos sociais, participantes afirmam que forças conservadoras da sociedade estão em ofensiva contra o povo organizado

Mayrá Lima,
de Brasília (DF)

Um ato em defesa da democracia. Assim foi considerada a audiência pública ocorrida dia 9 de julho na Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados com o objetivo de discutir a criminalização dos movimentos sociais. “Os movimentos como um todo estão respondendo a processos judiciais e ainda são desqualificados publicamente. Se antes, manifestações públicas, ocupações de terra e de moradia geravam repressão, hoje, setores do Estado respondem com a utilização indevida do judiciário para institucionalizar esta criminalização'', disse Gilson Cardoso, representante do MNDH.

O evento reuniu representantes de entidades como Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Via Campesina, Quilombolas, Indígenas, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) em uma grande defesa à legitimidade dos movimentos sociais. O debate foi sugerido pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) e aprovado na CLP por unanimidade.

“Onda” de perseguição

O ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), disse estar preocupado com uma possível “onda” de perseguição aos movimentos sociais, em especial, com o caso do MST no Rio Grande do Sul que, recentemente, sofreu represálias da Polícia Militar numa manifestação em Porto Alegre. O ministro se refere à ata do Conselho Superior do Ministério Público Federal do RS, de 3 de dezembro de 2007, em que se defende medidas para “dissolver” o MST. Dentre as formas, estão a proibição de qualquer deslocamento de trabalhadores sem-terra, incluindo marchas e caminhadas, intervenções em escolas de assentamentos, a “desativação” de todos os acampamentos do Rio Grande do Sul, a criminalização de lideranças e integrantes e a cassação dos títulos eleitorais de todos os membros do movimento.

Bode expiatório

De acordo com o ministro Vannuchi, “o país inteiro sabe da crise institucional que acomete os governantes estaduais (do RS)”. Para ele, “sempre há a tentação de repetir a velha estratégia de se eleger um bode expiatório externo que tente reunificar as forças clivadas do Governo Estadual, na medida que o vice-governador foi o protagonista de uma onde de denúncias fortíssimas”.Vannuchi sugeriu o encaminhamento da denúncia ao Conselho Nacional de Justiça.

A ata serviu de suporte para mais de oito ações contra os Sem Terra no Rio Grande do Sul, mas não só o MST sofre com as investidas da Brigada Militar.

Violência policial

O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Passo Fundo (RS), Leandro Scalabrin, presente do debate, citou uma série de exemplos em que a polícia utilizou bombas de gás, bombas de efeito moral e balas de borracha para dispersar manifestações de mulheres camponesas, estudantes e professores.

O presidente da CLP, deputado federal Adão Pretto (PT-RS) lembrou que em outros Estados também há processos que criminalizam os movimentos sociais. No último dia 12 de junho, o juiz da Justiça Federal de Marabá (PA), Carlos Henrique Haddad, condenou o advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT), José Batista Gonçalves a uma pena de dois anos e cinco meses de prisão por assessorar movimentos camponeses durante uma negociação com o Incra daquela região, logo após um protesto de agricultores sem terra organizados pela Contag, MST e Fetragri.

Ameaça à democracia

Já o representante do Conselho Federal da OAB, Antônio Augusto Brandão relatou o caso do defensor de Direitos Humanos, Roberto de Oliveira Monte. Mesmo sendo civil, Monte está sendo processado pela Justiça Militar por ter criticado a ditadura militar brasileira (veja mais em http://www.dhnet.org.br/denunciar/inqueritovil/index.htm) durante uma palestra proferida no Congresso Militar ocorrido em Natal(RN) há três anos atrás. “ Não podemos admitir a tentativa de criminalização dos movimentos sociais. Ao fazer isso, estamos contribuindo para matar o mais importante elemento subjetivo da democracia, que é de onde emerge a soberania popular”, afirmou Brandão.

Demarcações de terra

A perseguição e criminalização também se entende aos quilombolas e indígenas. De acordo com o representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Paulo Maldos, o caso da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol (RR) é cercado do uso de “mentiras”. “Depois de 30 anos de luta, os índios conseguiram que aquelas terras fossem demarcadas como terras da União. Lembrem que as terras não são dos índios. Somente seis arrozeiros permaneceram e fizeram ataques com armas ao índios, que receberam a PF com coquetéis molotove minas enterradas.

Na mesma linha da demarcação, a comunidade quilombola também sofre com ações parlamentares, como o Projeto de Decreto Legislativo 44/2007, proposto pelo deputado Valdir Colatto (PMDB/PR) que pretende regulamentar o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação. “Tentam nos comparar a delinqüentes, sem o mínimo respeito a nossa condição cidadã. Muitas vezes, tentam desqualificar as comunidades quilombolas para não reconhecer e demarcar suas terras”, reclamou o representante da Coordenação Nacional de Quilombos , Damião Braga.

Solidariedade aos movimentos

Além dos deputados presentes, líderes do PT e do Psol também participaram da audiência. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) e as senadoras Marina Silva (PT-AC) e Fátima Cleide (PT-RO), representando o Senado, foram prestar solidariedade aos movimentos sociais presentes. “A sociedade tem o direito de se organizar e se manifestar, sobretudo quando atuam no sentido de reparar as injustiças históricas que são cometidas contra segmentos sociais como os indígenas, os quilombolas e os trabalhadores sem terra”, disse Marina Silva, que também é ex-ministra do meio ambiente.

O líder do Partido dos Trabalhadores, deputado Maurício Rands (PT-PE) também condenou o Ministério Público do RS. “Ninguém pode ficar inerte diante dessas manifestações autoritárias. As forças democráticas não podem manter silêncio diante de tentativas reedição de intolerância da época dos governos militares”, disse.

Já para Chico Alencar (PSOL-RJ), é necessário se fazer uma “contra-ata, da liberdade e da democracia. A ata do Ministério Público diz que é preciso dissolver o MST. Pois bem, que se estenda isso aos cartéis, aos monopólios... Também queremos a extinção do MST, porque queremos que não haja mais nenhum sem-terra (no Brasil). Defendo o MST dentro dos preceitos da Constituição”, propôs.

*Com informações da Agência Brasil
Há homens que lutam um dia, e são bons;
Há outros que lutam um ano, e são melhores;
Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons;
Porém há os que lutam toda a vida
Estes são os imprescindíveis

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